Nascemos. A partir desse momento, as incertezas começam a fazer parte da vida que se inicia. Somos amados por nossos pais e, no meu caso, por minha mãe e irmãos. Sendo o caçula, logo me tornei o xodó da casa. Frágil, como meus irmãos diziam — era raquítico.
Até os meus três anos, não tenho qualquer lembrança. Mas me lembro do dia em que, acredito, minha mãe estava lavando a nova casa onde íamos morar, no bairro Humberto Alves — casa essa que hoje pertence ao meu irmão Daniel, o irmão do meio. Minha mãe lavava a casa ensaboada, e eu escorregava com a barriga de um lado para o outro. Era uma sensação de liberdade, aventura e grandes gargalhadas, mesmo com as reclamações dela.
A casa, até a segunda sala, tinha o chão de cimento queimado cinza. Os demais cômodos eram de cimento cru, áspero. Na primeira sala, que levava à segunda, havia duas pilastras em forma de arco. Lá, tínhamos quatro cadeiras de ferro vazadas, com pequenas almofadas no assento e no encosto, e uma mesinha de centro redonda.
Na segunda sala havia uma estante de madeira antiga, com várias divisórias. Na parte de cima, um compartimento para guardar objetos; na parte de baixo, mais dois compartimentos. Tínhamos uma TV em preto e branco, que, segundo as histórias que ouvia, foi presente do meu pai. Ela nos acompanhou por muitos anos após a morte da minha mãe. Carregava um valor sentimental, pois era a única coisa que me ligava a alguém que nunca conheci. Por isso, eu tinha um apego afetivo a ela.
Minha mãe adorava colocar um conjunto de jarras e copos na cor laranja com branco. Ah, não posso esquecer da pequena radiola, o toca-discos. Coitada, não tinha rotação regular — chamávamos de "fanha", porque as músicas saíam lentas. Minha mãe amava ouvir música todo domingo. Tocava Evaldo Braga, Cremilda, Giliard, Gonzagão, Antonio Marcos e outros. Mas o que ela mais gostava era Giliard. E, por incrível que pareça, a gente também adorava ouvi-lo.
No primeiro quarto, o dela, havia uma cama de casal bem arrumada e uma penteadeira com espelho quadrado. Nela, vários perfumes, escovas, maquiagens de todo tipo. Havia um perfume que nunca esqueci: o Cabeça Feita. Era alongado, com um ramo de erva dentro, e a tampa de madeira redonda. Uma fragrância inconfundível. Ciumenta como era, não deixava ninguém tocar nessa relíquia, além de outros perfumes, que hoje conhecemos como da Natura.
No segundo quarto dormíamos nós, os filhos. Como não éramos flores que se cheirassem, até as camas quebramos, e os pés eram sustentados por tijolos. Era uma loucura naquela época. Ah, ainda tinha um terceiro quarto, minúsculo que mal cabia uma cama e ao lado uma cozinha recuada.
Na cozinha, havia uma ilha de madeira branca com portas azul-celeste, onde se colocavam vasos decorativos, um liquidificador, pratos e copos. A mesa, também branca com detalhes azuis, tinha seis cadeiras. O fogão era amarelo, com abas laterais, e ao lado, um paneleiro. No quintal — que era enorme — havia um pé de goiaba onde eu adorava me pendurar e pegar frutos. O quintal era cercado por plantas, como hortelã, arruda e outras medicinais.
O banheiro ficava do lado de fora da casa. Antes de entrar, havia uma área onde eram guardados objetos antigos, e ao lado ficava o banheiro. O piso era de cimento queimado, e uma meia parede servia como divisória entre o vaso sanitário e o espaço do banho. Como o vaso não tinha descarga, utilizávamos baldes para sua higienização. No outro lado da divisória, havia um chuveiro, que, na verdade, era apenas uma torneira. O banheiro não tinha porta, e a privacidade era garantida apenas por uma cortina que fazia esse papel.
Apesar de termos um fogão a gás, também usávamos um fogão a carvão. A comida feita nele tinha um sabor diferente, um cheiro convidativo. Era indescritível.
Lembro, com muita nitidez, da luz — os raios de sol pareciam mais intensos, mais brilhantes. A claridade era bonita. Quando criança, eu brincava no quintal por horas agradáveis.
Como eu amava esses momentos. Fazer essas descrições é revisitar os cômodos mais agradáveis da memória, onde moram essas doces lembranças.